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jueves, 26 de marzo de 2009

O Lenço Farroupilha

A indumentária gauchesca promana, como um todo complexo que é de tres fontes distintas facilmente identificáveis.
A primeira é logicamente ibérica - lusitana, no caso do gaúcho brasileiro. A segunda é indígena, americana, e a terceira é gauchesca, nascida no pampa, do própri gaúcho.
A primeira fonte, a ibérica, nos forneceu as botas fortes (como as russilhonas), as esporas (como as nazarenas), as ceroulas de crivo, os calções (bragas), o cinturão, a camisa, o jaleco, a jaqueta, o barrete, o chapéu de feltro ou de palha (este, o abeiro português).
Peças indígenas de nossa indumentária são o chiripá (o primitivo chiripá), a faixa, a guaiaca original, o pala, a vincha.
E, finalmente, peças de invenção gauchesca são vários tipos de esporas, as botas de garrão, o chiripá passado entre as pernas, o cinturão de guaiacas, o tirador, o pala de seda, o poncho-pala, o poncho de oleado.
Ficam à margem das tres fontes o poncho (possivelmente europeu) e as bombachas (turcas, ao que tudo indica), peças tão importates no complexo que merecem um estudo à parte.
E o lenço? Ah, o lenço!
Seguramente essa peça deve ser incluída entre aquelas que vieram da europa. Com écharpe, cache-col ou foulard vem desde a Idade Média e é feminino e masculino, alternadamente. Na França dos Luíses aparece com destaque, sempre de seda, sempre enrolado ao pescoço, muitas vezes apertando altos colarinhos, raramente esvoaçando aos ventos, com as pontas soltas. Os marinheiros finalmente o trouxeram para as Américas, como uma gola removível de suas blusas típicas.
No cone-sul americano, na bacia do Prata o traje gaúcho a rigor nunca dispençou o lenço de seda ao pescoço.
Saint-Hilaire que esteve no RGS e no Prata em 1820/1821 viu gaúchos argentinos de Entre-Rios em São Borja e descreveu-lhes a indumentária: "Trazem os cabelos trançados e um lenço ao redor da cabeça, um outro lenço, a que dão um nó muito solto, serve-lhes de gravata; como arma exibem uma grande faca à cinta." (Viagem ao Rio Grande do Sul, Universidade de São Paulo, 1974, p. 34.). Da mesma época, Nicolau Dreys, igualmente francês, também menciona o lenço dos gaúchos: "...um lenço, quase sempre amarrado na cabeça,..." (Notícia Descritiva da Província do Rio Grande de São Pedro do Sul, Instituto Estadual do Livro, Porto Alegre, 1961, p. 163).
No Uruguai, Juan Manuel Blanes pintou o gaúcho as vacarias de golilla, o grande lenço aberto, esvoaçando às costas. No Brasil, o pintor Jean-Baptiste Debret também debuxou o gaúcho do Rio Grande do Sul com o lenço de pescoço, nos começos do século XIX.
Insofismável como peça da indumentária gauchesca brasileira ou castelhana, resta examinar o lenço como distintivo político, deste e do outro lado do rio Uruguai. Na Banda Oriental, aparece o lenço vermelho dos colorados seguidores de Frutuoso Rivera e o lencó branco dos nacionalistas de Oribe. Na Argentina, os colorados de Juan Manuel Rosas combatiam ferozmente os azules e blancos da oposição provincial, anti-portenha.
No Rio Grande do SUl, o lenço de pescoço aparece como distintivo político na chamada Guerra dos Farrapos (1835/1845). Os farrapos de Bento Gonçalves usavam um lenço de seda aberto, com duas pontas soltas às costas, e atado de modo peculiar à frente, quase como uma cruz sobre o peito.
A propósito, José Teixeira, do Rio Pardo, que lutou no Decênio Heróico, dá uma descrição completa do lenço, alcançando até mesmo um desenho de sua maneira de usar e afirmando que os farrapos não desmanchavam o nó, uma vez feito: simplesmente tiravam o lencó - atado - pela cabeça, e depois era só colocá-lo assim mesmo, outra vez. É o que se vê das notas de Aurélio Porto ao Processo dos Farrapos, Arquivo Nacional, 1933, p. 475. O informante, ele próprio um veterano farroupilha, descreve um outro símbolo dos guerrilheiros de 35: a barba emoldurando o rosto, sem bigodes e sem cobrir a face, assim como a que usava o General farroupilha David Canabarro.
O historiador gaúcho Alfredo Varela, autor da monumental obra em seis alentados volumes Histórias da Grande Revolução, publica nas primeiras páginas do 1º volume uma litografia coloridade um quadro do pintor que se assina simplesmente Liebscher, sem maiores identificações, aparentemente extraída do livro Vita di Giusepe Garibaldi(?). Nele aparece um gaúcho do período farroupilha, segundo a legenda, em traje festivo. Esse gaúcho está usando botas fortes, chiripágauchesco (aquele passado entre as pernas, como fralda), faixa de cintura com ponta solta, jaleco, camisa com mangas fofas, lenço farroupilha (colorado, aberto nas costas e com o nó de cruz) e chapéu de feltro de copa alta e aba estreita. E, claro, ostentando a barba ao estilo dos farrapos.
O quadro é precioso pelas informações que alcança ao pesquisador. Em primeiro lugar, confirma as afirmações do veterano guerrilheiro de 35 José Teixeira, do Rio Pardo, quanto ao tipo de barba que os farrapos usavam e sobre o lencó colorado. Por outro lado, confirma as assertivas de pesquisar anteriores (Antonio Augusto Fagundes, Indumentária Gaúcha, IGTF, Porto Alegre, 1977) sobre o chiripá tipo fralda efetivamente usado pelo gaúcho, nessa época. Aliás, o autor da presente pesquisa tomou mesmo a liberdade de batizar esse chiripá com o nome de chiripá farroupilha, para distiunguí-lo do primitivo chiripá, que era uma espécie de semi-saia aberta à frente. Aliás, outros estudiosos gaúchos, que nada disseram quanto ao chiripá primitivo, negaram o chiripá passado entre as pernas, o qual agora deverão aceitar, diante da prova iconográfica, definitiva.
Houve um momento em que o alto comando farroupilha, apesar do lenço colorado aberto às costas e atado com o nó de cruz adotado espontaneamente pelos farrapos, quis dotar as suas forças de um lenço mais oficial. O grande impulsionador da idéia foi sem dúvida o major Bernardo Pires, do exército republicano, Chefe de Polícia durante a guerra, com sede em Piratini. Pires era um gaúcho de Canguçu, liberal e maçon e conhecido pelo seu heroísmo, a ponto de ser chamado O Mártir do Seival, mercê de sua atuação naquela heróica batalha. Bernardo Pires não era um homem instruído formalmente, mas era um excelente auto-didata. Artista plástico primitivista, insculpiu até borrachões de chifre, para canha. E pintou a alegoria que devia constar do lenço farroupilha, sobre uma idéia original do major Mariano de Mattos, alto prócer farroupilha, fluminense de nascimento.



O primeiro lenço foi mandado confeccionar nos Estados Unidos, por Bernardo Pires. E explica-se: a pátria de Lincoln era um modelo ideal para o Brasil que os farrapos sonhavam, com o Estados independentes e federados. Não é demais lembrar que o muito americano John Griggs, o João Grande de Camaquã, lutou e morreu integrando as forças navais republicanas, sob o mando de Garibaldi. A maçonaria vermelha, de origem francesa e de feição republicana (tem a divisão dos três poderes) tinha muita força nos Estados Unidos, na jovem república rio-grandense e no Prata. Foi, aliás, através de um comerciante de Montevidéu que foi feita essa primeira encomenda dos lenços. Chamava-se Marcial Rodriguez, esse comerciante, conforme Apolinário Porto Alegre (Cancioneiro da Revolução de 1835, Globo, Porto Alegre, 1935, p.57). O pedido foi feito a 10 de maio de 1842. Ao chegar a encomenda, a carga foi toda queimada, com as caixas e tudo, no próprio porto de Rio Grande. Era tão forte a animadversão dos imperiais relativamente aos lenços farroupilhas, que o famigeradoFrancisco Pedro de Abreu (o Chico Pedro, o Moringue, o Fuínha) dizia querer saber quem era o autor de tão infeliz lembrança para metê-lo no arrocho e defumá-lo. Os lenços finalmente chegaram a 3 de dezembro de 1943 ao acampamento volante das forças republicanas em terras de Manoel de Moura, nos campos de Piratini (que os farrapos chamavam Piratinin). Apolinário, aliás, atribuiu o desenho desse lenço ao Padre Francisco das Chagas Martins Avila (o famoso Padre Chagas, da Aseembléia farroupilha) e diz ter em seu poder (dele, Apolidário) o esboço original do trabalho, que teria sofrido apenas insignificantes modificações, comparado com o lenço mandado confeccionar por Bernardo Pires de Oliveira.
Bem, trata-se de um equívovo. Não se duvida que o tal esboço tenha realmente existido, mas se fosse o original do lenço não teria sido da autoria do Padre Chagas. Se fosse a autoria do Padre Chagas, não seria o modelo do lenço farroupilha.
Outro detalhe estranhável na crônica de Apolinário (saiu outra edição pela Erus, Cia. União de Seguros Gerais, Porto ALegre, Porto Alegre, 1981, p. 70/71) ressalta de suas afirmações. Veja-se: "Apresentavam dois padrões, conforme os desenhos remetidos. Uma é muito conhecido. Tem no centro o duplo pavilhão da República, é encimado pela fama e traz em torno as principais vitórias republicanas com os nomes locais e respectivas datas. É o que contém a quadra supra. Suponho que seja da lavra do próprio Bernardo Pires.
A quadrilha a que se refere o texto é aquela, famosa:

"Nos ângulos do continente
O pavilhão tricolor
Se divisa sustentado
Por liberdade e valor".

Mais adiante, Apolinário Porto Alegre acrescenta: "O outro padrão era menos complicado. Exibia no centro dois indígenas, cada um sustentando a bandeira tricolor, em meio desfraldo, como no outro lenço. Acompanhavam-no alguns dísticos. Este, nunca o vi".
O detalhe estranhável: nunca foi visto. Ninguém o viu, ao que parece.
Aurélio Porto, nas celebradas Notas afirma que a segunda edição dos lenços, a que tem as letras SGC (bordadas em seda e talvez iniciais do dono do lenço, segundo o historiador) foi mandada confeccionar na Alemanha, talvez, pela Casa Francisco Rasteiro & Cia., de Rio Grande, E ele, o historiador, ainda esclarece que o lenço usado para envolvr o crânio de Bento Gonçalves da Silva, quando foi translado dos seus restos mortais do cemitério do Cordeiro, em Camaquã, para o mausoléu, em praça pública, na cidade de Rio Grande, era um dos exemplares encomendados nos Estados Unidos, um dos primeiros lenços.
A respeito das famosas três letras do lenço, tão enigmáticas reina controvérsia. Será que significavam Salve, glorioso Continente, como queria Varela, sem maiores explicações? A verdade é que não foi encontrado nenhum lenço, entre os exemplares pesquisados, que não tivesse as letras SGC. Se Aurélio Porto estivesse certo, todos os exemplares conhecidos até agora são da segunda remessa.
Por outro lado, não foi encontrado até agoea qualquer exemplar com o padrão menos complicado, a que faz referência Apolinário Porto Alegre, onde apareciam dois indígenas sustentando cada um , a meio desfraldo (sic) uma bandeira tricolor.




Que se saiba, existe um exemplar do lenço farroupilha em Rio Grande, no acervo do museu do CTG Mate Amargo e que foi doado por herdeiros de Caetano Gonçalves da Silva. Esse exemplar ostenta a orla com as ondas azuis e brancas. Na Biblioteca Municipal de Pelotas o autor dessa pesquisa descobriu, emoldurado, outro exemplar do lenço farroupilha, mas de padrão diferente. É aquele que está, em tamanho menor, no centro do exemplar que tem a orla co as ondas azuis e brancas. No exemplar pelotense, a orla é vermelha, ou, pelo menos, avermelhada (a cor desbotada dificulta a precisão). Aparentemente, o exemplar de Pelotas foi recortado, para ficar menos e encaixar bem na moldura.
No Museu Júlio de Castilhos, de Porto Alegra, existem três exemplares distintos do lenço farroupilha. O primeiro é o lenço com cercadura vermelha, igual ao exemplar pelotense e está em exposição. O segundo é o lenço com a orla em ondas azuis e brancas, igual ao exemplar rio-grandino e está também exposto. O terceiro é um curioso exemplar e está em processo de restauração. Tem o padrão básico do primeiro exemplar, mas a cor predominante é um azulão forte, tipo anil. Assim, das duas, uma: ou houve um terceiro padrão, a que não aludem os cronistas (o que é altamente improvável) ou se pintou de azul um exemplar do lenço onde a cor dominante era o vermelho. O restaurador Luiz Cúria, nos começos deste século, foi o fac-totum do Museu Júlio de Castilhos e gozava da fama de ser muito bom em sua arte. Pode perfeitamente ser o autor da superposição de cores - isso, claro, na hipótese de não ter existido mesmo um terceiro padrão.
Não se pode garantir qual foi o padrão de lenço que chegou em primeiro lugar e que foi entrege aos farrapos a 3 de dezembro de 1843 nos campos de Piratinin.Tudo leva a crer que aqueles queimados com caixa e tudo no Porto de Rio Grande tinham esse mesmo padrão. Aliás, os farrapos só poderiam ter usado esse lenço durante um ano (1844) e dois meses (janeiro e fevereieo de 1845, quando se fez a paz).
O segundo exemplar, confeccionado na França ou na Alemanha, só chegou depois da paz. Conservado pelos remanescentes farrapos, aqueles que continuaram republicanos em pleno Império, vai ter muito uso exatamente na propaganda republicana. Inclusive, será pregado na bandeira tricolor dos farrapos, com brasão central. Aliás, não é demais recordar que a bandeira rio-grandense nasceu assim: os arrautos da República brasileira, seus corifeus e pregadores iniciais, pensando logicamente que a bandeira era retangular (na realidade, era quadrada) reconstituíram a bandeira com essa forma e costuraram no meio o lenço farroupilha. Com a Constituição castilhista de 1891 (a primeira constituição rio-grandense) essa bandeira foi transformada em símbolo do novo Estado. Mutatis mutandis, é a bandeira gaúcha, ainda hoje.
Além dos exemplares aqui arrolados e existentes atualmente, há mais um na coleção da Profa. Vera Stedile Zattera, de Caxias do Sul. Trata-se de um exemplar em tudo igual àquele do museu do CTG Mate Amargo, de Rio Grande. E consta que existe outro exemplar no acervo de uma escola, em Porto Alegre, o que completaria a soma de sete lenços farroupilhas identificados, até agora.
Ou oito, se considerarmos aquele que envolve o crânio do General Bento Gonçalves da Silva e que decerto está com seus gloriosos despojos no mausoléu que lhe foi erijido, na p'aça central da cidade portuária de Rio Grande - que aliás, em vida ele nunca consegui tomar.

Antonio Augusto Fagundes
Texto produzido para Vera Stedile Zattera.

sábado, 21 de marzo de 2009

Surgimento e importância econômica das charqueadas




O gado foi a base da economia gaúcha durante um longo período da história do Rio Grande. Introduzido pelos jesuítas, atraiu os tropeiros que vinham de São Paulo e Minas para buscar gado e levá-lo para aquelas províncias. Serviu, também, de esteio para a fixação de habitantes, na medida em que permitiu uma atividade econômica para os estancieiros que aqui se fixaram.

Essa base seria ainda mais consolidada com o surgimento das charqueadas. Elas iriam produzir o charque, um produto que era a base da alimentação de escravos em todo o Brasil. E, com essa produção, trariam riqueza à região de Pelotas, que se tornou uma espécie de "capital cultural" do Estado.

As charqueadas começaram a surgir na região de Pelotas em torno de 1780. Anteriormente, o charque já era produzido no sul do continente, mas de maneira artesanal e em pequena escala. No entanto, uma série de secas sucessivas no Nordeste, onde estava concentrada a maior produção de charque do país, criou uma oportunidade para o produto gaúcho. E o charque começou a ser produzido em maior escala.


Opulência

A partir desse momento, a produção de charque se tornou o centro da vida econômica da região de Pelotas. As charqueadas estavam situadas ao longo de rios que facilitavam o transporte para o porto de Rio Grande - de onde o charque seguia para o Rio e outros portos brasileiros. Com o dinheiro gerado por elas, Pelotas se transformou. Essa renda permitiu que surgisse um grupo de famílias ricas e que cultivavam hábitos sofisticados.

Em 1835, Wolfhang Harnish descrevia a cidade de Pelotas como um local de opulência extrema: "... já funcionam 35 charqueadas nos arredores da cidade... A riqueza que trazem é fantástica... Esses milionários pelotenses bem que poderiam ter vivido no Rio ou em Nice ou ainda em Paris, poderiam ter concorrido com os fidalgos russos no luxo e na dissipação de Monte Carlo".


Miséria

A contraparte dessa opulência eram as próprias charqueadas, onde os enormes grupos de escravos eram submetidos a um trabalho exaustivo. E, como estavam reunidos em grupos muito grandes, os senhores adotavam a política de extrema intimidação para mantê-los obedientes. As charqueadas eram verdadeiros "estabelecimentos penitenciários", como bem as descreveu o francês Nicolau Dreyf, no livro "Notícia Descritiva da Provincia de São Pedro do Rio Grande do Sul".

Parte desse tratamento brutal dado aos escravos se devia ao interesse econômico: quanto mais produzissem, mais seus donos lucravam. Outra parte, entretanto, vinha do medo: com uma enorme população escrava, Pelotas era, potencialmente, um foco de rebeliões. Por isso, ao menor sinal de revolta eram tomadas providências drásticas. Para que se tenha uma idéia do tamanho da população escrava de Pelotas: existiam ali, em 1833, 5.169 escravos, 3.555 homens livres e 1.136 libertos.

Não obstante a violência e os métodos relativamente primitivos usados pelas charqueadas da região de Pelotas, elas foram capazes de sobreviver e gerar lucros consideráveis até o final do escravismo. A partir de então, enfrentaram dificuldades cada vez maiores e terminaram por se extinguir.

viernes, 20 de marzo de 2009

O início do aproveitamento do couro




As oficinas eram várias, e entre as profissões manufatureiras encontravam-se aquelas que faziam o processamento dos despojos do gado abatido, em especial do couro. Existiam curtumes -- localizados à margem dos rios --, oficinas de sapateiros, correeiros, etc. Os artesãos organizavam-se em corporações, e havia alcaides responsáveis pelo bom andamento dos trabalhos em cada uma das oficinas. A estrutura assemelhava-se à existente na Europa Medieval, onde os profissionais se reuniam em corporações ou guildas.

Esse florescimento, entretanto, causaria constantes atritos com espanhóis e portugueses, que viam com maus olhos a proteção que os jesuítas davam aos índios. Para os colonizadores brancos, as reduções representavam um empecilho à escravização dos índios, e sua independência relativa era considerada uma afronta aos conquistadores.

Além disto, as Missões contavam com imensos rebanhos, que atraíam portugueses e espanhóis e, desde a sua formação, eles atacavam-nas periodicamente em busca de índios, gado e couros.

A cobiça dos portugueses e espanhóis, unida aos interesses políticos das duas coroas ibéricas acabariam por decretar o fim das Missões. Em 1750, através de um tratado firmado entre os dois países, a região das Missões passou à posse de Portugal, em troca da Colônia de Sacramento (que só foi entregue definitivamente à Espanha em 1777).

A ocupação da região missioneira pelos portugueses não se faria, porém, sem resistência por parte dos indígenas. Uma página singular da história do sul do continente se encerraria de forma violenta, com a dizimação de grande parte dos índios e a expulsão dos jesuítas.

Suas cidades, obras de arte, livros -- toda a estrutura montada, enfim -- seriam quase que totalmente arrasados, ficando poucos traços para servirem de documento vivo de uma cultura inigualável por muito tempo.

Mas, apesar disto, as Missões deixaram uma herança preciosa para o Rio Grande do Sul: os rebanhos de bovinos e cavalos. Esses animais, soltos, iriam se multiplicar cada vez mais, tornando o Rio Grande uma área ideal para o desenvolvimento da pecuária.

Isto atraiu o colonizador branco, que passou a se instalar na região, de forma sistemática, a partir de 1726, quando chegaram os primeiros lagunistas com o fito de se estabelecerem em caráter definitivo.

jueves, 19 de marzo de 2009

Início dos Sete Povos das Missões




Ao final do século XVII, devido aos constantes conflitos de fronteira entre Portugal e Espanha, os jesuítas resolveram concentrar a população indígena convertida numa área onde estivesse mais segura, e escolheram, para isto, a zona localizada na região noroeste do Rio Grande do Sul.

Os habitantes das diversas reduções jesuíticas foram transferidos para essa região, dando origem aos "Sete Povos das Missões": São Francisco de Borja (fundado em 1682), São Nicolau (1687), São Luiz Gonzaga (1687), São Miguel Arcanjo (1687), São Lourenço Mártir (1690), São João Batista (1697) e Santo Angelo Custódio (1796). Algumas dessas povoações situavam-se em locais que haviam sido anteriormente ocupados por reduções jesuíticas, mas que tinham sido abandonadas devido aos ataques de bandeirantes.

Com a formação dos Sete Povos, a obra dos jesuítas atingiu o seu apogeu. A agricultura e a pecuária desenvolveram-se e, em 1691, um missionário informava que "tantos bois, vacas, terneiros e cavalos (há) em nossos campos que tu em muitos lugares, nada mais vês, de tanto gado gordo e bonito".

Mais adiante, comentava que "dentro dos aldeamentos o Padre Missionário distribui, gratuitamente, duas vezes ao dia, a carne que os índios precisam", deixando claro que os animais eram criados para abate.

Não era apenas com a conversão e alimentação dos índios que os jesuítas se preocupavam. Vindos da Europa, onde havia um considerável desenvolvimento do artesanato, os padres procuraram incutir nos indígenas uma mentalidade que valorizasse o trabalho manual.

O aprendizado de uma profissão era constantemente incentivado e, desde a infância, os índios eram orientados para a escolha de uma atividade agrícola ou artesanal. Além de habituarem os nativos ao trabalho, os jesuítas procuravam com isto tornar as missões auto-suficientes, independentes das possessões portuguesas e espanholas que as cercavam, e que sempre olhavam com cobiça seus índios e seu gado.

É difícil, porém, estabelecer o grau de relacionamento comercial entre as missões e as possessões espanholas (a que estavam legalmente vinculadas). Segundo Lugon, autor da obra de maior fôlego sobre o assunto, as reduções exportavam diversos artigos, dentre os quais peles, couros curtidos e arreios, para Buenos Aires, Corrientes, Santa Fé, Assunção e Vila Rica; e importavam produtos manufaturados e metais.

Ainda de acordo com Lugon, a importação de manufaturados quase cessou, assim que as oficinas das missões foram convenientemente aparelhadas, permanecendo somente a importação de metais.

miércoles, 18 de marzo de 2009

A importância das missões




Situado fora do eixo de comércio do Brasil com a metrópole, o Rio Grande do Sul foi, durante o seu processo de formação, uma área de maior valor político do que econômico.

Embora não contasse com produtos de exportação de grande interesse, como o Norte e Nordeste (com as especiarias e o açúcar) e, mais tarde, as Minas Gerais (com o ouro), o Rio Grande atraía portugueses e espanhóis pela possibilidade de controle do sul do continente que sua ocupação abria.

Isto fez com que fosse, desde o princípio, uma região em constante conflito, onde as duas potências ibéricas lutavam pelo domínio da terra, provocando constantes alterações de seus limites fronteiriços -- que só se fixariam definitivamente em 1909, quando a última questão de demarcação de limites entre o Brasil e o Uruguai foi resolvida.

Inicialmente, o Rio Grande era uma "terra de ninguém", de difícil acesso e muito pouco povoada. Vagavam por suas pradarias os índios guarani, charrua, tapes; e, vez por outra, aventureiros que penetravam em seu território em busca de índios para apresar.

Esse quadro foi modificado com a chegada dos padres jesuítas, que, no início do século XVII, na região formada pelos atuais estados do Rio Grande do Sul e Paraná, e pela Argentina e Paraguai, fundaram o que ficou conhecido como "Missões Jesuíticas".

Nelas se reuniam em torno de pequenos grupos de religiosos, grandes levas de indios guarani convertidos, que levavam uma vida regida por regras ditadas pelos padres.

Procurando garantir a alimentação dos índios convertidos, os jesuítas introduziram o gado nas suas reduções, onde o clima e a vegetação propícios fizeram com que se multiplicasse rapidamente. Ao agirem assim, os missionários criaram dois atrativos para aqueles que apresavam índios: agora, além de encontrarem índios já "civilizados" -- graças ao trabalho dos jesuítas -- achariam também o gado, que seria, a partir de sua proliferação, a principal fonte das atividades econômicas do Sul.

Os ataques às reduções jesuíticas passaram a ser feitos de forma organizada, e até 1640 diversas bandeiras paulistas estiveram no Rio Grande do Sul para capturar índios e gado, provocando o desmantelamento de algumas das reduções, e a migração das populações nelas residentes para áreas consideradas mais seguras. Muitas vezes, ao partirem, os habitantes deixavam atrás de si o gado, que, solto, continuava a se multiplicar.

martes, 17 de marzo de 2009

Os tropeiros




Introdução

O Rio Grande do Sul entrou na economia nacional pelas mãos dos tropeiros e patas das mulas. Pois foi o comércio de mulas que integrou a região à economia nacional, ainda no século XVII e início do XVIII, antes mesmo que o Rio Grande do Sul existisse formalmente.

A história do tropeirismo – um dos capítulos mais importantes da formação gaúcha e um dos menos lembrados – integrou diferentes regiões do Brasil, e traçou a rota da formação de muitas cidades da região Sul e Sudeste. Foi através dessa atividade que se consolidou o movimento comercial do país, que se definiram vocações econômicas regionais, e que as enormes extensões de pampas gaúchos encontraram seu destino, que marca a atividade econômica de algumas regiões do Estado até os dias atuais.

O gado
Antes de se analisar a atividade dos tropeiros é preciso lembrar da origem da riqueza que exploravam: o gado disperso pelos campos gaúchos.
No início do século XVII chegaram jesuítas à região formada pelos atuais estados do Paraná e Rio Grande do Sul. Esses padres estabeleceram as Missões Jesuíticas, onde reuniam, em torno de pequenos grupos de religiosos, um grande número de índios guaranis convertidos. Para sustentar essas populações, foi introduzida a atividade pecuária, com o gado solto nas pradarias.
Em 1628 já havia relatos sobre a presença de rebanhos nas reduções jesuíticas. Mas acredita-se que tenham levado os animais da margem direita para a esquerda do rio Uruguai em 1629, dando origem a um rebanho imenso que ficaria conhecido como Vacaria do Mar na área situada entre a Laguna dos Patos e os rios Jacuí e Negro. Essa Vacaria era regularmente predada por espanhóis e portugueses, e para garantir o gado os jesuítas criam a Vacaria dos Pinhais, na região de campos de cima da serra que ficou conhecia como Campos da Vacaria.

Predadores
A formação das Vacarias permitiu que se realizasse, na área do atual Estado, a atividade de preia do gado selvagem. Caçava-se o gado e se retirava o couro, que era exportado para a Europa. A carne que não era consumida pelos predadores, era deixada no campo, apodrecendo. Todos predavam gado: portugueses, índios de aldeamentos, moradores das terras espanholas que tinham permissão de suas autoridades para vaquear, indivíduos que vaquejavam por conta própria.
Enquanto isso, Portugal e Espanha continuavam na sua dança para ver quem, afinal, seria o dono do Sul do Continente. Tratados não cumpridos por ambas as partes e a política de “é de quem conseguir manter” tornavam a região que é o atual Rio Grande do Sul uma terra de ninguém, onde as duas coroas disputavam a posse do território.

Mineração
Era ainda esse o quadro do território riograndense quando, no final do século XVII, se descobriu ouro na região das Minas Gerais. A descoberta de ouro (e depois de diamantes) causou um grande afluxo populacional para a região. A população da área cresceu exponencialmente, causando a falta de alimentos e de produtos básicos. De 1700 a 1760, calcula-se que por volta de 700 mil pessoas imigraram para o Brasil com destino à Minas Gerais. A esses, se somaram um grande número de escravos africanos, bem como migrantes vindos de outras áreas do Brasil e escravos transferidos ilegalmente da região de produção de açúcar no Nordeste.
Não é de se admirar, portanto, que no início do século XVIII a falta de gêneros alimentícios tenha causado grandes crises, acompanhadas por expressiva mortalidade. As crises mais fortes foram as de 1697-1698, 1700-1701 e 1713.
A atividade mineradora, o crescimento das cidades e a formação de uma elite com recursos aumentaram a necessidade de animais para transporte de carga.
Onde encontrar esses animais? A resposta era fácil – no sul do continente, onde estavam as enormes Vacarias. A bem da verdade, a região não era propriamente portuguesa. No início do período de mineração a América ainda era dividida pelo Tratado de Tordesilhas, e teoricamente os rebanhos pertenciam à Espanha. Mas isso era um detalhe, resolvido pela política de ocupação efetiva do território. E foi assim, vindo de uma região de posse duvidosa, que o gado gaúcho entrou na história brasileira.

O primeiro tropeiro e os caminhos que criou
Por que caminhos andavam esses primeiros tropeiros? Quem eram eles?
O primeiro grande tropeiro foi um fidalgo português, Cristóvão Pereira de Abreu, descendente do condestável Nuno Álvares Pereira. Cristóvão de Abreu nasceu em Ponte de Lima, em 1680, e veio para o Rio de Janeiro aos 24 anos. Aqui, casou com D. Clara de Amorim, com quem não teve filhos.
Em 1722, aos 42, fez um grande negócio. Arrematou o monopólio de couros do sul do Brasil, mediante o compromisso de pagar 70 mil cruzados para a Fazenda Real anualmente. Tratou de começar a explorar esse manancial de ganhos, chegando a exportar 500 mil peças de boi por ano, através da Colônia de Sacramento (então de posse dos Portugueses).
Cristóvão de Abreu também instalou sua própria estância, situada entre o Canal de Rio Grande e a planície de Quintão. Mas o seu grande feito seria estabelecer um caminho por terra entre os pampas e o mercado que clamava por gado.
Francisco de Souza Faria, morador de Laguna, havia levado dois anos abrindo uma estrada que ia de Morro dos Conventos, em Araranguá, na planície costeira da atual Santa Catarina, até os Campos de Curitiba, no planalto. A obra teve início em 1717, e por essa estrada Cristóvão Pereira subiu pela primeira vez levando 800 cavalos e mulas, possibilitando a ligação entre o Sul e a vila de Sorocaba em São Paulo, que se tornou o grande entreposto de venda de gado durante o período da mineração, no ano de 1931.
No ano seguinte, em uma segunda viagem – agora com 3 mil animais e 130 tropeiros – Cristóvão de Abreu alargou e melhorou o caminho, construindo vários pontilhões. Levou um ano e dois meses para atingir Sorocaba – e iniciou um novo ciclo da economia gaúcha.
Mais tarde, Cristóvão Pereira abriu um novo caminho, que ligava diretamente os campos de Viamão aos Campos de Lajes. Ao longo desse caminho foram surgindo povoados: Santo Antonio da Patrulha, São Francisco de Paula, Capela de Nossa Senhora da Oliveira da Vacaria.
As aventuras do primeiro tropeiro não pararam por ai. Mais tarde, em 1735, foi convocado pelo governo português para defender as fronteiras portuguesas por terra, enquanto o Brigadeiro José da Silva Paes prestava apoio marítimo. O governo português tinha conhecimento de que os espanhóis pretendiam ocupar toda a área que ia até a ilha de santa Catarina, e era preciso garantir a presença portuguesa.
Cristóvão aceitou o desafio e com 160 homens partiu para o Sul, sustentando a entrada do canal de Rio Grande por cinco meses, até que o Brigadeiro Silva Pais chegou com suas tropas por mar. No ponto onde Cristóvão de Abreu havia se instalado com seus homens, e onde o brigadeiro desembarcou, foi fundado o quartel e vila de Rio Grande. E seria ali que, em 1755, morreria Cristóvão Pereira de Abreu, o homem que colocou o Rio Grande do Sul no mapa econômico do Brasil.
As duas rotas originais estabelecidas por Cristóvão de Abreu perderam importância quando se passa a explorar diretamente a região das Missões, e se passa a utilizar um caminho que leva diretamente à essa área, partindo de Vacaria e indo direto a Cruz Alta, então na fronteira entre Portugal e Espanha.

Os números
Uma vez estabelecidas as rotas de transporte, as tropas se multiplicaram e o comércio de gado deslanchou. A preferência era pelos muares, já que mulas e burros eram mais adequados para o transporte em uma região montanhosa como Minas Gerais. Mas também se exportava gado vacum e cavalos.
Estabelecer um número exato de animais exportados é quase impossível. Há relatos falando em mais de 50 mil animais, com grande predominância de muares, na metade do século XVIII.
As tropas saiam do Rio Grande do Sul em setembro ou outubro, época em que, graças às chuvas, encontrariam melhores pastos pelo caminho. Prosseguiam até Curitiba, onde ficavam por algum tempo, engordando o gado. De lá, partiam para Sorocaba, o grande centro de comércio de gado, a tempo de participar das grandes feiras que se realizavam entre abril e maio.

O dia-a-dia
O tropeiro era um homem acostumado às intempéries. É difícil definir sua origem. Havia paulistas, reinóis, nascidos no próprio Rio Grande que se dedicaram ao tropeirismo nessa primeira fase. Alguns deles enriqueceram, e se tornaram verdadeiros “empresários do transporte”.
Ao partir de Viamão, Cruz Alta ou dos demais centros de envio de tropas, sabia que teria dias duros pela frente. Ao final de cada dia de trabalho, cobria a carga dos animais com couro, e deitava-se no chão, sobre um pedaço de couro, ao ar livre, no chamado encosto, o pouso em pasto aberto. Em alguns pontos, encontrava abrigos construídos – os ranchos. Neles, o rancheiro oferecia alojamento para os homens, cobrando apenas o milho e o pasto consumidos pela tropa.
Enquanto o gado comia, o tropeiro preparava sua alimentação.
Sua alimentação se baseava no toucinho, feijão preto, farinha, pimenta do reino, café e fubá. O feijão tropeiro misturava feijão quase sem molho com pedaços de carne seca e toucinho, e era servido com farofa e, quando havia, couve.
Entre os animais, destacava-se a “madrinha”, com a crina toda enfeitada com fitas. Era o cavalo, égua ou mula mais calma, bastante conhecida pelos demais animais, que era a cabeça da tropa.
Dessa maneira seguiam em uma viagem que levava meses, quase sempre acompanhando o roteiro dos rios e atravessando os campos abertos, desafiando o perigoso Rio Pelotas na divisa entre Rio Grande e Santa Catarina, pousando por algum tempo nos Campos de Curitiba até chegarem à feira de Sorocaba.

O fim de um ciclo
A atividade de tropeiragem teve seu auge ente 1725 e o final do século, quando a atividade mineradora começou a declinar. Nessa época, entretanto, um novo produto permitiu que o Rio Grande do Sul continuasse a desempenhar o seu papel de fornecedor de outros centros produtores brasileiros. Era o charque, que começou a ser produzido na região de Pelotas por volta de 1780. Com ele, os rebanhos gaúchos encontrariam uma nova destinação.
Entretanto, os tropeiros continuaram a percorrer os caminhos do Sul, ainda que em menor escala. A tropeiragem sofreu um grande baque com a instalação das ferrovias, no final do século XIX. Manteve-se, contudo, em menor escala, até o a década de 50 do século XX.

Homenagem
Uma merecida homenagem a esses homens foi prestada entre março e maio de 2006, quando uma equipe de 18 profissionais saiu com 26 animais da cidade de Cruz Alta, no Rio Grande do Sul, rumo a Sorocaba. Promovida pelo programa de televisão Globo Rural, a Tropeada percorreu o 1.270 quilômetros em 66 dias, repetindo a rota dos tropeiros pelo Caminho Novo de Vacaria. A tropa saiu de Cruz Alta e passou por Carazinho, Passo Fundo, Lagoa Vermelha, Vacaria e Bom Jesus no Rio Grande do Sul. Em Santa Catarina, passou por Lages, Marombas e Mafra. Seguiu pela Lapa, Rio Negro, Palmeira, Castro e Piraí no Paraná. Cortou terras de Itararé, Itapeva, Buri, Alambari, Itapetininga, Araçoiaba da Serra e chegou a Sorocaba, em São Paulo.
No caminho, fazendas antigas, museus, belíssimas paisagens marcaram o percurso daquele que foi, um dia, o caminho pelo qual o Rio Grande foi se tornando brasileiro – o Caminho dos Tropeiros.

domingo, 15 de marzo de 2009

Como surgiram, quem eram e o papel dos tropeiros





Introdução
O Rio Grande do Sul entrou na economia nacional pelas mãos dos tropeiros e patas das mulas. Pois foi o comércio de mulas que integrou a região à economia nacional, ainda no século XVII e início do XVIII, antes mesmo que o Rio Grande do Sul existisse formalmente.
A história do tropeirismo – um dos capítulos mais importantes da formação gaúcha e um dos menos lembrados – integrou diferentes regiões do Brasil, e traçou a rota da formação de muitas cidades da região Sul e Sudeste. Foi através dessa atividade que se consolidou o movimento comercial do país, que se definiram vocações econômicas regionais, e que as enormes extensões de pampas gaúchos encontraram seu destino, que marca a atividade econômica de algumas regiões do Estado até os dias atuais.

O gado
Antes de se analisar a atividade dos tropeiros é preciso lembrar da origem da riqueza que exploravam: o gado disperso pelos campos gaúchos.
No início do século XVII chegaram jesuítas à região formada pelos atuais estados do Paraná e Rio Grande do Sul. Esses padres estabeleceram as Missões Jesuíticas, onde reuniam, em torno de pequenos grupos de religiosos, um grande número de índios guaranis convertidos. Para sustentar essas populações, foi introduzida a atividade pecuária, com o gado solto nas pradarias.
Em 1628 já havia relatos sobre a presença de rebanhos nas reduções jesuíticas. Mas acredita-se que tenham levado os animais da margem direita para a esquerda do rio Uruguai em 1629, dando origem a um rebanho imenso que ficaria conhecido como Vacaria do Mar na área situada entre a Laguna dos Patos e os rios Jacuí e Negro. Essa Vacaria era regularmente predada por espanhóis e portugueses, e para garantir o gado os jesuítas criam a Vacaria dos Pinhais, na região de campos de cima da serra que ficou conhecia como Campos da Vacaria.

Predadores
A formação das Vacarias permitiu que se realizasse, na área do atual Estado, a atividade de preia do gado selvagem. Caçava-se o gado e se retirava o couro, que era exportado para a Europa. A carne que não era consumida pelos predadores, era deixada no campo, apodrecendo. Todos predavam gado: portugueses, índios de aldeamentos, moradores das terras espanholas que tinham permissão de suas autoridades para vaquear, indivíduos que vaquejavam por conta própria.
Enquanto isso, Portugal e Espanha continuavam na sua dança para ver quem, afinal, seria o dono do Sul do Continente. Tratados não cumpridos por ambas as partes e a política de “é de quem conseguir manter” tornavam a região que é o atual Rio Grande do Sul uma terra de ninguém, onde as duas coroas disputavam a posse do território.

Mineração
Era ainda esse o quadro do território riograndense quando, no final do século XVII, se descobriu ouro na região das Minas Gerais. A descoberta de ouro (e depois de diamantes) causou um grande afluxo populacional para a região. A população da área cresceu exponencialmente, causando a falta de alimentos e de produtos básicos. De 1700 a 1760, calcula-se que por volta de 700 mil pessoas imigraram para o Brasil com destino à Minas Gerais. A esses, se somaram um grande número de escravos africanos, bem como migrantes vindos de outras áreas do Brasil e escravos transferidos ilegalmente da região de produção de açúcar no Nordeste.
Não é de se admirar, portanto, que no início do século XVIII a falta de gêneros alimentícios tenha causado grandes crises, acompanhadas por expressiva mortalidade. As crises mais fortes foram as de 1697-1698, 1700-1701 e 1713.
A atividade mineradora, o crescimento das cidades e a formação de uma elite com recursos aumentaram a necessidade de animais para transporte de carga.
Onde encontrar esses animais? A resposta era fácil – no sul do continente, onde estavam as enormes Vacarias. A bem da verdade, a região não era propriamente portuguesa. No início do período de mineração a América ainda era dividida pelo Tratado de Tordesilhas, e teoricamente os rebanhos pertenciam à Espanha. Mas isso era um detalhe, resolvido pela política de ocupação efetiva do território. E foi assim, vindo de uma região de posse duvidosa, que o gado gaúcho entrou na história brasileira.

O primeiro tropeiro e os caminhos que criou
Por que caminhos andavam esses primeiros tropeiros? Quem eram eles?
O primeiro grande tropeiro foi um fidalgo português, Cristóvão Pereira de Abreu, descendente do condestável Nuno Álvares Pereira. Cristóvão de Abreu nasceu em Ponte de Lima, em 1680, e veio para o Rio de Janeiro aos 24 anos. Aqui, casou com D. Clara de Amorim, com quem não teve filhos.
Em 1722, aos 42, fez um grande negócio. Arrematou o monopólio de couros do sul do Brasil, mediante o compromisso de pagar 70 mil cruzados para a Fazenda Real anualmente. Tratou de começar a explorar esse manancial de ganhos, chegando a exportar 500 mil peças de boi por ano, através da Colônia de Sacramento (então de posse dos Portugueses).
Cristóvão de Abreu também instalou sua própria estância, situada entre o Canal de Rio Grande e a planície de Quintão. Mas o seu grande feito seria estabelecer um caminho por terra entre os pampas e o mercado que clamava por gado.
Francisco de Souza Faria, morador de Laguna, havia levado dois anos abrindo uma estrada que ia de Morro dos Conventos, em Araranguá, na planície costeira da atual Santa Catarina, até os Campos de Curitiba, no planalto. A obra teve início em 1717, e por essa estrada Cristóvão Pereira subiu pela primeira vez levando 800 cavalos e mulas, possibilitando a ligação entre o Sul e a vila de Sorocaba em São Paulo, que se tornou o grande entreposto de venda de gado durante o período da mineração, no ano de 1931.
No ano seguinte, em uma segunda viagem – agora com 3 mil animais e 130 tropeiros – Cristóvão de Abreu alargou e melhorou o caminho, construindo vários pontilhões. Levou um ano e dois meses para atingir Sorocaba – e iniciou um novo ciclo da economia gaúcha.
Mais tarde, Cristóvão Pereira abriu um novo caminho, que ligava diretamente os campos de Viamão aos Campos de Lajes. Ao longo desse caminho foram surgindo povoados: Santo Antonio da Patrulha, São Francisco de Paula, Capela de Nossa Senhora da Oliveira da Vacaria.
As aventuras do primeiro tropeiro não pararam por ai. Mais tarde, em 1735, foi convocado pelo governo português para defender as fronteiras portuguesas por terra, enquanto o Brigadeiro José da Silva Paes prestava apoio marítimo. O governo português tinha conhecimento de que os espanhóis pretendiam ocupar toda a área que ia até a ilha de santa Catarina, e era preciso garantir a presença portuguesa.
Cristóvão aceitou o desafio e com 160 homens partiu para o Sul, sustentando a entrada do canal de Rio Grande por cinco meses, até que o Brigadeiro Silva Pais chegou com suas tropas por mar. No ponto onde Cristóvão de Abreu havia se instalado com seus homens, e onde o brigadeiro desembarcou, foi fundado o quartel e vila de Rio Grande. E seria ali que, em 1755, morreria Cristóvão Pereira de Abreu, o homem que colocou o Rio Grande do Sul no mapa econômico do Brasil.
As duas rotas originais estabelecidas por Cristóvão de Abreu perderam importância quando se passa a explorar diretamente a região das Missões, e se passa a utilizar um caminho que leva diretamente à essa área, partindo de Vacaria e indo direto a Cruz Alta, então na fronteira entre Portugal e Espanha.

Os números
Uma vez estabelecidas as rotas de transporte, as tropas se multiplicaram e o comércio de gado deslanchou. A preferência era pelos muares, já que mulas e burros eram mais adequados para o transporte em uma região montanhosa como Minas Gerais. Mas também se exportava gado vacum e cavalos.
Estabelecer um número exato de animais exportados é quase impossível. Há relatos falando em mais de 50 mil animais, com grande predominância de muares, na metade do século XVIII.
As tropas saiam do Rio Grande do Sul em setembro ou outubro, época em que, graças às chuvas, encontrariam melhores pastos pelo caminho. Prosseguiam até Curitiba, onde ficavam por algum tempo, engordando o gado. De lá, partiam para Sorocaba, o grande centro de comércio de gado, a tempo de participar das grandes feiras que se realizavam entre abril e maio.

O dia-a-dia
O tropeiro era um homem acostumado às intempéries. É difícil definir sua origem. Havia paulistas, reinóis, nascidos no próprio Rio Grande que se dedicaram ao tropeirismo nessa primeira fase. Alguns deles enriqueceram, e se tornaram verdadeiros “empresários do transporte”.
Ao partir de Viamão, Cruz Alta ou dos demais centros de envio de tropas, sabia que teria dias duros pela frente. Ao final de cada dia de trabalho, cobria a carga dos animais com couro, e deitava-se no chão, sobre um pedaço de couro, ao ar livre, no chamado encosto, o pouso em pasto aberto. Em alguns pontos, encontrava abrigos construídos – os ranchos. Neles, o rancheiro oferecia alojamento para os homens, cobrando apenas o milho e o pasto consumidos pela tropa.
Enquanto o gado comia, o tropeiro preparava sua alimentação.
Sua alimentação se baseava no toucinho, feijão preto, farinha, pimenta do reino, café e fubá. O feijão tropeiro misturava feijão quase sem molho com pedaços de carne seca e toucinho, e era servido com farofa e, quando havia, couve.
Entre os animais, destacava-se a “madrinha”, com a crina toda enfeitada com fitas. Era o cavalo, égua ou mula mais calma, bastante conhecida pelos demais animais, que era a cabeça da tropa.
Dessa maneira seguiam em uma viagem que levava meses, quase sempre acompanhando o roteiro dos rios e atravessando os campos abertos, desafiando o perigoso Rio Pelotas na divisa entre Rio Grande e Santa Catarina, pousando por algum tempo nos Campos de Curitiba até chegarem à feira de Sorocaba.

O fim de um ciclo
A atividade de tropeiragem teve seu auge ente 1725 e o final do século, quando a atividade mineradora começou a declinar. Nessa época, entretanto, um novo produto permitiu que o Rio Grande do Sul continuasse a desempenhar o seu papel de fornecedor de outros centros produtores brasileiros. Era o charque, que começou a ser produzido na região de Pelotas por volta de 1780. Com ele, os rebanhos gaúchos encontrariam uma nova destinação.
Entretanto, os tropeiros continuaram a percorrer os caminhos do Sul, ainda que em menor escala. A tropeiragem sofreu um grande baque com a instalação das ferrovias, no final do século XIX. Manteve-se, contudo, em menor escala, até o a década de 50 do século XX.

Homenagem
Uma merecida homenagem a esses homens foi prestada entre março e maio de 2006, quando uma equipe de 18 profissionais saiu com 26 animais da cidade de Cruz Alta, no Rio Grande do Sul, rumo a Sorocaba. Promovida pelo programa de televisão Globo Rural, a Tropeada percorreu o 1.270 quilômetros em 66 dias, repetindo a rota dos tropeiros pelo Caminho Novo de Vacaria. A tropa saiu de Cruz Alta e passou por Carazinho, Passo Fundo, Lagoa Vermelha, Vacaria e Bom Jesus no Rio Grande do Sul. Em Santa Catarina, passou por Lages, Marombas e Mafra. Seguiu pela Lapa, Rio Negro, Palmeira, Castro e Piraí no Paraná. Cortou terras de Itararé, Itapeva, Buri, Alambari, Itapetininga, Araçoiaba da Serra e chegou a Sorocaba, em São Paulo.
No caminho, fazendas antigas, museus, belíssimas paisagens marcaram o percurso daquele que foi, um dia, o caminho pelo qual o Rio Grande foi se tornando brasileiro – o Caminho dos Tropeiros.

A outra identidade da história política Farrapa




Enquanto a disputa pelo poder central arrasta a república para práticas cada vez menos limpas, no rincão mais ao sul do país, a Semana Farroupilha demarca a disputa pela identidade política da região. Da direita agrária sugadora dos recursos do estado a extrema-esquerda que nem participa do processo eleitoral, a hegemonia ideológica é motivo de peleia porteira adentro. Embora o restante do país não o perceba, se avizinha o 20 de setembro, data mais importante da história do Rio Grande do Sul.

Em meados de 1835 estala a guerra contra o Partido Conservador, caramuru, aliado do Rio de Janeiro. Cerca de um ano depois, o general da cavalaria farrapa Antônio de Souza Netto, comanda a tomada de Porto Alegre. Com a vitória contra as tropas do Império luso-brasileiro, Netto e seus oficiais proclamam a República Rio-Grandense. A historiografia discute se a república foi um golpe de propaganda ou um caso pensado. Hoje, 171 anos depois, isto pouco ou nada importa. Sabemos que a história é feita de saltos, rupturas e descontinuidades. O gesto político do comandante das tropas farroupilhas deu vazão a um turbilhão político que até hoje pode mudar a correlação de forças no estado mais ao sul do Brasil.

Não há condições de aqui fazermos um debate histórico profundo, mas, algumas referências têm de ser citadas. A proclamação da República libera sentimentos e alianças diretamente relacionadas à formação política e étnica dos territórios lindeiros ao Rio Grande. Esta parte da história, além de não ser reivindicada pelos altos conselheiros do Movimento Tradicionalista Gaúcho (MTG), tampouco foi visto na minissérie global A casa das sete mulheres.

As fronteiras atuais do país com a ex-província Cisplatina foram demarcadas somente em 1828. Os exércitos do Norte, comandados pelo general uruguaio Juan Antonio Lavalleja, tinham como meta a reconquista das Missões Orientais, território onde hoje se encontram os 7 Povos das Missões Guaranis (do lado oriental do Rio Uruguai). Conseguindo pouco mais que um empate militar, a delegação da Banda Oriental assina com o Império do Brasil o tratado de demarcação definitiva. Lembrando, isto aconteceu apenas sete anos antes da deflagração do conflito na Província de São Pedro.

Um outro fato do lado de lá da fronteira foi fundamental para os rumos da Guerra e da Revolução Farroupilha. Após a traição do caudilho Fructuoso Rivera, o cacicado dos povos Charruas e Minuanos aposta todas as suas chances históricas na República Rio-Grandense. Estas duas nações, constitutivas da pampa e do tipo humano do gaúcho original, tiveram participação estratégica no projeto político mais ambicioso da região em toda a sua história. Antes, haviam sido duplamente traídas. Primeiro durante a chamada Gesta Artiguista, ou segundo o seu nome mais político, na Liga Federal dos Povos Livres.

O próprio ex-capitão dos Blandengues, José Gervasio Artigas fora traído pelo patriciado de Montevidéu, cuja aliança com os comerciantes centralistas do porto de Buenos Aires, provocara seu banimento e exílio para o Paraguai. O grosso de sua cavalaria era composto pelos ginetes charruas, exímios lanceiros dotados de um senso de organização composto por conselheiros e chefes militares eleitos. A segunda traição foi realizada pelo Brigadeiro Rivera, homem leal aos interesses imperiais portugueses na pampa. Este chefe político e militar, no Uruguai recém independente, convocou os caciques para uma trégua. No local marcado, suas tropas preparam uma emboscada, dando vazão a um dos maiores genocídios da história da América Latina.

Os sobreviventes do massacre de Rivera cruzaram a fronteira ainda viva, rumando ao norte. Poucos anos depois, se somam na tropa republicana. A composição étnica do exército farroupilha reflete os anseios dos mais oprimidos. Quando da guerra, de cada três peões-soldadoss farrapos, um era negro ou indígena. A identidade da Pátria Grande não pára aí O próprio idioma falado, era muito mais parecido ao portunhol, ou dialeto bajano, ainda existente nos mais de mil quilômetros da fronteira com o Uruguai. O português era a língua franca dos negros e de somente parte da oficialidade-estancieira. Além do portunhol, os idiomas indígenas (charrua, minuano, guarani e tape) eram correntes na tropa e nos acampamentos farrapos.

A outra identidade olvidada é a dos afro-descendentes, cuja expressão bélica foi o esquadrão de cavalaria dos lanceiros negros. Comandados pelo oficial republicano e abolicionista Joaquim Teixeira Nunes, o Gavião, a rendição incondicional dos negros em armas foi exigência de Osório e Lima e Silva para o acordo de paz. Outra vez traídos pelos escravagistas mais preocupados com o preço do charque do que com as instituições republicanas, a derrota se consuma na ?batalha? dos Porongos. Nesta localidade, o corpo de Lanceiros Negros foi dizimado, sem armas, surpreendidos pelo abandono da posição defensiva de David Canabarro. Este seguira a orientação de ?diplomatas? gaúchos como Vicente da Fontoura, o mesmo que assinara o ?tratado? de Ponche Verde pelas costas, criando o fato consumado da ?derrota honrosa?.

Aprofundando-nos além dos episódios pontuais, vemos na história esquecida justamente a identidade política que não se quer deixar circular. A presença de negros e indígenas foi fundamental para o ambicioso projeto federalista comandado por Artigas, congregando as Províncias Unidas do Prata sob a estrutura política da Liga Federal dos Povos Livres.

Avançadíssimo para seu tempo, o programa era embasado em uma grande mobilização de massas, abolicionista e com reforma agrária incluindo as nações indígenas e os afro-descendentes. A extensão da Liga englobava as hoje províncias argentinas de Corrientes, Entre Ríos, Paraná, Misiones, a totalidade do Uruguai, partes do Paraguai e mais de um terço do atual território gaúcho. A expressão nativa e africana não constituía a bucha de canhão das guerras, como foi o caso do exército brasileiro e antes das bandeiras de São Paulo. Mas sim o próprio Estado-Maior da Liga Federal, e particularmente dos conselheiros de Artigas.

Recuperar o debate da presença indígena e negra no seio do maior movimento de cultura nativa e regional do Brasil, o MTG, é essencial para o resgate da ala liberal-radical da República Rio-Grandense, de orientação federalista e contra a escravidão. De tão polêmico e perigoso, o assunto é simplesmente ignorado pela grande mídia local. Isto porque, refletindo a moldura institucional da oligarquia gaúcha, aliada aos grandes capitais (locais, nacionais e transnacionais), os quatro maiores grupos de mídia do Rio Grande do sul não podem permitir vazar um sentimento desta ordem no grosso da população.


Em um mundo globalizado, disputar as raízes da própria história não é pouca coisa. Para um país como o Brasil, cujo controle da comunicação reflete o domínio de enclave de alguns quarteirões do Rio de Janeiro e de São Paulo, o assunto pode ser o pano de fundo para um novo pacto federativo. Ganhando substância, como a renegociação ou moratória da dívida do Rio Grande, a memória pode virar munição para virar uma conjuntura morna e sem interesses estratégicos de fundo.

No ano que cumprimos 250 anos do martírio do cacique guarani Sepé Tiaraju, uma leitura substancial da epopéia Farroupilha é necessária. Esta Revolução gaúcha, mesmo com todas as suas contradições e mazelas, teve cara, cor e cheiro dos povos constitutivos deste pedaço de mundo. Esta identidade, caso seja resgatada pelos seus próprios protagonistas, pode reescrever a história do Rio Grande nas próximas décadas.

viernes, 13 de marzo de 2009

Antecedentes da Revolução Farroupilha




Difícil relacionamento com o Centro

Através da criação de gado e da produção de charque, o Rio Grande do Sul integrou-se à economia central de exportação de forma subsidiária, como abastecedor do mercado intemo. Com isso, o Rio Grande passava a possuir uma riqueza econômica, deixando de ser considedado apenas como ponto estratégico da defesa do contrabando no Prata.

Na verdade, estes foram processos que ocorreram interligados ao longo do século XVIII: de um lado, a apropriaçào econômica da terra, por parte de particulares, mediante o saque e a violência contra os espanhóis; de outro, a preocupação oficial lusa com o comércio platino, implicando disputas e controvérsias em torno da posse de Sacramento e das Missões.
Em face do permanente estado de alerta, mais contavam para a defesa da terra as forças irregulares da campanha gaúcha - os estancieiros com seus homens - do que propriamente as tropas de linha, sediadas em Sacramento ou em Rio Grande, reduto militar fundado pela Coroa em 1737.

Além dos sucessivos incidentes de tomada e retomada da Colônia do Sacramento pelos portugueses, o Rio Grande do Sul sofreu três invasões castelhanas em seu território, além de ser palco da chamada "Guerra Guaranítica", que envolveu tropas luso-castelhanas em um combate com os índios missioneiros, tentando obrigá-los a abandonar as reduçòes em obediência às disposições do Tratado de Madri. Assinado em 1750 entre as duas nações ibéricas, este tratado estabeiecia que as Missões passariam para o domínio português, ficando Sacramento com a Coroa espanhola, não chegando contudo a se efetivar a troca. Dentro deste contexto de verdadeiro acampamento militar a que ficara reduzido o Rio Grande, estabeleceu-se um modus vivendi entre a Coroa e os senhores locais. Além da terra que lhes era concedida, os estancieiros passaram a ocupar cargos de chefes e guardas da fronteira. Este poder dos senhores de terras, exer- cido na maior parte das vezes em defesa de seus interesses privados, entrava seguidamente em choque com a autoridade dos comandantes militares que representavam os interesses da Coroa no Rio Grande.

Se, por um lado, a economia gaúcha antes do fim do século não atingira ainda um grau de estabilidade e rendimento que desse respaldo ao poder dos senhores locais, por outro lado, a importância militar do estancieiro-soldado com suas tropas fez com que a Coroa permitisse uma certa autonomia do poder local em relação à administração lusa.
Desta forma, a apropriaçào econômica da terra foi acompanhando a apropriação militar: em cada nova àrea conquistada aos espanhóis, eram distribuídas sesmarias para a criação de gado. No final do século XVIII, o enriquecimento proporcionado pelo charque contribuiu para agravar os pontos de atrito existentes entre a camada senhorial local e os representantes da Coroa. Clãs familiares enriquecidos passaram a pressionar o govemo no sentido de obter cada vez mais poder e autoridade, usufruindo dos cargos em proveito da consolidação da sua riqueza.
Um exemplo dessa interferência foi a política de redistribuição de terras iniciada a partir de 1780, quando começou o processo de expropriação dos antigos proprietários, como os colonos açorianos ou mesmo detentores de sesmarias da primeira fase de expansão da fronteira, em funçào da nova elite enriquecida. Conforme depoimento da época, ocorreu uma verdadeira "febre" na corrida pelas sesmarias, registrando-se muitos abusos. Referia-se, em 1808, Manoel Antomio de Magalhães, no seu Almanack da Vila de Porto Alegre, à apropriação de terras no Rio Grande do Sul:

"Um homem que tinha a proteçào tirava uma sesmaria em seu nome, outra em nome do filho mais velho, outras em nome da filha e filho que ainda estavam no berço, e deste modo há casa de quatro e mais sesmarias: este pemicioso abuso parece se deveria evitar."

Na verdade, os agentes da Coroa no Rio Grande do Sul não eram os representantes dos fazendeiros nem os defensores dos seus interesses, mas o poder colonial, por razões niilitares, era obrigado a ceder às ambições dos chefes locais, dando-lhes terras, fazendo "vista grossa" aos abusos de poder que se registravam".
Paralelamente ao florescimento das charqueadas gaúchas, surgiram estabelecinientos similares no Prata - os saladeros - que passarani a disputar com o produto rio-grandense o abastecimento do mercado intemo brasileiro, além de controlarem o fornecimento para Cuba.

No final do século XVIII, o charque tomou-se o primeiro produto de exportação do Vice-Reinado do Prata e a base de sua economia, reorientando a criação de gado para fins niercantis.
As necessidades da economia pecuária e a defesa de sua produção foram levadas em conta pelas autoridades do Vice-Reinado, assim como as da própria Coroa espanhola. Desde 1778 vigorava o regime de livre comércio, o que permitiu aos saladeiristas, fazendeiros e comerciantes mantereni uma atividade de exportação em crescimento.
No mesmo intuito de beneficiar o setor de ponta da econoniia platina, foi concedida a isenção de direitos de importaçào sobre o sal de Cádiz (insumo fundamental para a produção do charque) e, pelas Reais Ordens de 10.4.1793 e 20.12.1892, estabeleceu-se a isenção dos direitos de exportação sobre as cames salgadas. Tais incentivos, concedidos pelas autoridades, acarretavam um menor custo de produção para os saladeiros platinos, permitindo que eles colocassem sua produção a um mais baixo preço nos mercados brasileiros.

O charque rio-grandense, no caso, nào era objeto de iguais medidas protecionistas ou de especial atenção das autoridades, uma vez que se tratava de uma economia subsidiária da economia central de exportaçào.

Entretanto, essas melhores condições de desenvolvimento do charque platino, sob amparo govemamental, foram anuladas, em face das perturbações políticas ocorridas na regiào no início do século XIX. De 1810 a 1820, o Prata esteve envolvido em guerras de independência, que determinaram a crise dos saladeros locais. Essas perturbações políticas na àrea, que iniciaram com a independência das Províncias Unidas do Rio da Prata em 1810, sob a hegemonia de Buenos Aires, prosseguiram em disputas internas entre as forças da chamada Banda Oriental (hoje República do Uruguai) contra a supremacia argentina e culminaram com as invasões das tropas de D. João no Prata. Em 1820, a Banda Oriental foi anexada ao Brasil com o nome de Província Cisplatina, o que terminou por desorganizar totalmente a produção saladeiril da região. O gado uruguaio foi então orientado para as charqueadas rio-grandenses, seus peões incorporados ao exército brasileiro e vàrios fazendeiros e militares sulinos estabeleceram-se com estâncias em território oriental.

Face, pois, a perturbações políticas ocorridas na região, o Rio Grande do Sul pôde suplantar seu concorrente no abastecimento de charque no mercado interno brasileiro.
O fortalecimento econômico dos pecuaristas rio grandenses tendeu a se expressar também no plano político-administrativo. Nos momentos finais do domínio colonial português no Brasil, começaram, assim, a surgir áreas de atrito cada vez maiores entre os representantes da Coroa na região e a camada senhorial sulina, enriquecida pela pecuária em ascensão.

Texto extraído do livro "A Revolução Farroupilha"
Sandra Jatahy Pesavento Editora Brasiliense

jueves, 12 de marzo de 2009

Viagem ao Rio Grande do Sul

Auguste de Saint-Hilare, traduzido por Adroaldo Mesquita da Costa

trecho do Capítulo I...Porto Alegre, 21 de julho de 1820

"Porto Alegre, sede da Capitania do Rio Grande do Sul, residência do general e do ouvidor, está situada em aprazível posição, sobre uma península formada por uma colina que avança na direção norte-sudeste, sobre a Lagoa dos Patos. Esta Lagoa mede sessenta léguas de comprimento, tem, em sua origem, os nomes de Lagoa de Viamão ou Lagoa de Porto Alegre. Estende-se, a princípio, de norte a sul, suas águas de uma correnteza sensível são, ordinariamente, doces, numa extensão de trinta léguas. A lagoa deve sua origem a quatro rios navegáveis, que reúnem águas em frente de Porto Alegre e que, divididos em sua embocadura, num grande número de braços, formam um labirinto de ilhas; três desses rios, o Gravataí, que é o mais oriental, o Rio dos Sinos e o Rio Caí, vêm do norte, nascem na Serra Geral e têm pequeno curso. O quarto rio, de nome Jacuí ou Guaíba, é muito maior que os outros; vem do oeste e recebe em seu curso numerosos afluentes.

A cidade de Porto Alegre se eleva em anfiteatro, sobre um dos lados da colina de que já falei, voltado para noroeste. Compõe-se de três longas ruas principais, que começam um pouco aquém da península, no continente, estende-se, em todo comprimento, paralelamente à lagoa, sendo atravessado por outras ruas muito mais curtas, traçadas sobre o declive da colina. Várias dessas ruas transversais são calçadas; outras só em parte, mas todas em muito mau estado. Na chamada Rua da Praia, que é a mais próxima da lagoa, existe, por quase toda parte, defronte de cada grupo de casas, uma calçada feita de lages diante da qual são colocados, de distância em distância, marcos estreitos bastante altos.



As casas de Porto Alegre são cobertas de telhas pintadas de branco em sua parte anterior, construídas em tijolo sobre alicerces de pedra e bem conservadas; a maior parte possui sacadas; são em geral, maiores que as das outras cidades do interior do Brasil e muitas possuem um andar além do térreo; outras têm mesmo dois.







A Rua da Praia, a única comercial, é extremamente movimentada. Nela se encontram numerosas pessoas a pé e a cavalo, marinheiros e muitos negros, carregando fardos. É provida de lojas muito bem instaladas, de vendas bem sortidas e de oficinas de várias profissões. Quase a igual distância desta rua há um grande cais que avança para a lagoa, e à qual se tem acesso por uma larga ponte de madeira de aproximadamente cem passos de comprimento, guarnecida de peitoris e sustentada por pilares de pedra. As mercadorias, que aí se descarregam, são recebidas na extremidade dessa ponte, debaixo de um armazém de vinte e três passos de largura por trinta de comprimento, sustentado sobre oito pilastras de pedra, em que se apóiam outras de madeira. A vista desse cais seria de um belo efeito para a cidade, se não fosse prejudicada pela construção, à entrada da ponte, de um edifício muito pesado e rústico que mede quarenta passos de comprimento, para servir de alfândega.





Uma das três grandes ruas, chamada Rua da Igreja (atual Rua Duque de Caxias) , estende-se sobre o cume da colina. É aí que se acham os três principais edifícios da cidade: o Palácio, a Igreja Paroquial e o Palácio da Justiça. Estão construídos em alinhamento, um ao pé do outro, voltados para o noroeste, e do outro lado da rua, em frente, levantaram apenas um muro de apoio para não prejudicar um dos mais belos panoramas existentes. Abaixo desse muro, sobre a encosta da colina, uma praça, infelizmente muito irregular, cujo terreno é sustentado por pedras que mal afloram à superfície, formando canteiros dispostos em losangos.





Além da Rua da Igreja, do Palácio, dos edifícios próximos a essa praça e das casas construídas mais abaixo, avista-se a lagoa, que pode ter a mesma largura do Loire em Orleans, rodeada de ilhas baixas, cobertas de vegetação pouco crescida. Entre elas, vêem-se serpentear os braços dos quatro rios que mencionei acima, mas é impossível determinar, exatamente, a que rio pertencem porque, antes de chegar à lagoa, eles se cruzam e se confundem. As águas que correm na direção do Gravataí, na extremidade mais oriental da lagoa, aí chegam descrevendo uma imensa curva (imagem), apresentanndo-se como um belo rio, distinto dos demais. Um pouco mais ao norte, outras águas formam uma grande bacia, compreendida entre duas faixas de terra, que ambas se curvam em semicírculo deixando em sua extremidade só uma abertura muito estreita. Alguns trechos dos rios mostram-se por trás das ilhas, e dessa mistura de água e terra resulta um conjunto muito agradável. Para completar esse quadro, acrescentei que o horizonte é limitado pelos cumes da Serra Geral, que toma a direção de leste para o norte e se perde à distância.



Desejando-se apreciar uma paisagem diferente, mas também cheia de belezas, basta, logo que se chega ao ponto mais alto da cidade, na Rua da Igreja, voltar-se para o lado oposto àquele que acabo de descrever.



A parte da lagoa que banha a península do lado sudoeste forma uma grande enseada de forma semi-elíptica, de águas geralmente tranqüilas. Um vale, largo e pouco profundo, limita a parte mais baixa da enseada; nas margens o Conde Figueira mandou plantar, recentemente, uma aléia muito larga de figueiras selvagens que, futuramente, constituirá aprazível lugar para passeios. Mais adiante, o terreno se acha coberto de árvores e principalmente de arbustos; vêem-se, aqui e ali, casas de campo; mais além, afinal, estendem-se vastos gramados cobertos de bosques, capões e filas de arbustos copados que desenham os contornos irregulares de grande número de sebes. A lagoa se estende obliquamente para o sul, orlada de colinas pouco elevadas; confunde-se no horizonte com as nuvens e ao longe avista-se um rochedo esbranquiçado que surge no meio das águas (atualmente conhecida como "Ilha do Presídio"). O panorama que se observa diante dos olhos, do lado noroeste, é mais aprazível e mais animado; alguma coisa de calmo que convida ao sonho.

Os edifícios construídos no topo da colina não apresentam, afora isso, outra beleza senão a de sua situação; pode-se mesmo afirmar que eles não estão à altura da importância da cidade e riqueza da Capitania.

O Palácio do Governador não passa de uma construção comum, de um só andar e nove varandas na frente. Internamente mal dividido, não possui uma peça onde se possa receber uma sociedade tão numerosa como a que se reuniria facilmente em Porto Alegre. O Palácio da Justiça é ainda muito mais mesquinho; só tem o pavimento térreo. A Igreja Paroquial, cujo acesso se faz por uma escadaria exterior, tem duas torres desiguais; é clara e bem ornamentada, com dois altares, além dos que se encontram na capela-mor; mas é muito pequena, pois contei apenas quarenta passos da capela-mor até a porta.

Os outros edifícios públicos de Porto Alegre são menos importantes do que esses que venho descrevendo. Além da igreja paroquial, vêem-se mais duas outra ainda não terminadas. Numa, contudo, celebram missa: a outra, ainda não coberta, está com sua construção paralisada. A Casa da Câmara não passa de um pavimento térreo (Casa Rosa). Um particular, desde que medianamente rico, não quereria habitá-la. Aqui, a cadeia não faz parte do edifício da Casa da Câmara. Há duas muito pequenas, localizadas à entrada da cidade. Na extremidade da Rua da Praia, duas construções vizinhas servem de armazéns para a marinha, de depósito de armas, e onde se instalaram, para as necessidades das tropas, oficinas de armeiro, carreiro e seleiro. Admirei a ordem, o arranjo; poderia mesmo dizer, a elegância, reinante na sala destinada às armas de reserva. Do lado da lagoa, onde esses prédios têm fachada, cada um apresenta uma espécie de corpo principal alongado, só de pavimento téreo e em cuja extremidade há um pavilhão de um andar. Entre os dois edifícios, há um espaço considerável a que corresponde, em plano mais elevado, a Igreja das Dores (imagens 1, 2), uma daquelas de que já falei. Defronte à igreja, além dos armazéns, e portanto, próximo à lagoa, vê-se uma coluna encimada por um globo, que indica ser a cidade sede de uma comarca (imagem). Diante dela construiu-se um duplo quebra-mar de pedra, destinado a servir de cais para dois armazéns. Esse conjunto formaria um belo efeito, se a igreja estivesse concluída, se o terreno existente entre ela e os dois armazéns tivesse sido nivelado e se estes, embora construídos sob o mesmo modelo, não apresentassem diferenças chocantes. Fora da cidade, sobre um dos pontos mais elevados da colina, onde ela se acha construída, iniciou-se a contrução de um hospital (Hospital Santa Casa), cujas proporções são tão grandes, que provavelmente não seja terminado tão cedo; mas a sua posição foi escolhida com rara felicidade, porque é bem arejado, bastante afastado da cidade, para evitar contágios; ao mesmo tempo, muito próximo para que os doentes fiquem ao alcance de socorro de qualquer espécie; se escolheram o lado noroeste da península para aí construírem a cidade, foi porque os navios só por este lado podem ancorar. Entretanto, há, também, casas no lado oposto da colina porém esparsas e mal alinhadas, entremeadas de terrenos baldios, na maior parte pequenas, mal construídas e quase todas habitadas por gente pobre. Desde que aqui me encontro, já contei cerca de vinte a vinte e cinco embarcações no porto, e asseguram-me que há, muitas vezes, até cinqüenta. Podem entrar no porto sumacas, brigues e embarcações de três mastros.

Situada à margem de uma lagoa, que se estende até o mar, podendo, ao mesmo tempo, comunicar-se com o interior por vários rios navegáveis, cuja foz fica diante de seu porto, a cidade de Porto Alegre deve, necessariamente, tornar-se em breve, rica e florescente. Fundada há cerca de cinqüenta anos, já conta uma população de dez a doze mil almas, e alguém, aí residente há dezessete anos, me informa que nesse espaço de tempo, ela aumentou em dois terços. Pode ser considerada como principal entreposto da Capitania, sobretudo das regiões que ficam ao noroeste. Os negociantes adquirem quase todas as mercadorias no Rio de Janeiro e as distribuem nos arredores da cidade; em troca exportam, principalmente, couros, trigo e carne seca; é também de Porto Alegre que saem todas as conservas exportadas da província. O rápido aumento da população fez com que os terrenos se tornassem mais valorizados aqui do que nas cidades do interior; poucas casas possuem jardins e muitas não têm sequer quintal; daí um grave inconveniente de atirarem à rua todo o lixo, tornando-as imundas. As encruzilhadas, os terrenos baldios e, principalmente, as margens da lagoa são entulhadas de sujeira; os habitantes só bebem água da lagoa e, continuamente, vêem-se negros encher seus cântaros no mesmo lugar em que outros acabam de lavar as mais emporcalhadas vasilhas.

Sobre a população de Porto Alegre já disse que se compõe, principalmente, de brancos, em geral, grandes, bem constituídos, de bela tez; acrescentei que as mulheres são muito claras, coradas e várias delas muito bonitas, não se furtam a conversar com homens, possuindo maneiras delicadas e um tom distinto. Aqui não há tanta vida social como nas cidades européias; porém há muito mais do que em outras cidades do Brasil.

São freqüentes as reuniões nas residências para saraus, e algumas senhoras tocam, com maestria o violão e o piano, instrumento este desconhecido no interior, por causa das dificuldades de seu transporte. É na Rua da Praia , próximo ao cais, que fica o mercado; nele vendem-se laranjas, amendoim, carne seca, pão, feixes de lenha e legumes, principalmente couve. Como no Rio de Janeiro, as vendedoras são negras; algumas vendem acocoradas junto à mercadoria; outras possuem barracas, dispostas desordenadamente. Vêem-se, também, em Porto Alegre, negros que mascateiam fazendas pelas ruas. Atualmente vendem muito o fruto da araucária, a que chamam pinhão, nome que se dá, na Europa, às sementes de pinheiro. Usam-no cozido ou ligeiramente assado, ao chá ou entre as refeições, sendo freqüente presentear com ele os amigos.

Porto Alegre, 26 de julho - Parece que seguirei amanhã com o conde para o Rio Grande. Levarei comigo somente José Mariano; Firmiano e Laruotte seguirão pela lagoa, com minha bagagem. Quanto ao negro Manoel, a quem eu pagava desde Curitiba, sem que me fosse de utilidade alguma, e do qual tenho suportado, com tamanha paciência, os excessivos melindres, resolveu deixar-me no justo momento em que podia prestar algum serviço, pois que devia conduzir, nesta viagem, duas mulas carregadas de malas. O único motivo que me alegou foi o de que desejava voltar à sua terra. Reduzi, por isso, minha bagagem a duas malas, que poderão ser levadas por um dos animais do conde, conduzido por um empregado de seu ajudante de campo. Esta viagem me contraria mais do que posso dizê-lo. Devemos ir muito depressa; chegaremos tarde e partiremos cedo; não gozarei de nenhuma liberdade; nada poderei fazer além deste diário.

Com o imprestável José Mariano, estarei à mercê de toda gente e não saberei o que será feito de minha bagagem. Afora isso, é preciso que eu deixe aqui quase toda minha bagagem com Laroutte e Firmiano, empregados, também, sem nenhuma experiência. Não sei quando poderão embarcar, sendo muito provável que eu me demore muito mais tempo no Rio Grande, à espera deles, desprevenido de tudo e sem saber que resolução tomar.

Porto Alegre, 27 de julho - Não partiremos hoje, como era esperado, porque choveu durante todo o dia; passa-se o tempo, nada faço e esta viagem se prolonga mais do que desejava.

miércoles, 11 de marzo de 2009

El gaucho Argentino




Aunque se la utilizó en todo el río de la Plata - y aún en Brasil - no existe absoluta certeza sobre el origen de la palabra gaucho. Es probable que el vocablo quichua huachu (huérfano, vagabundo) haya sido transformado por los colonizadores españoles utilizándose para llamar gauchos a los vagabundos y guachos a los huérfanos. También existe la hipótesis de que los criollos y mestizos comenzaron a pronunciar así (gaucho) la palabra chaucho, introducida por los españoles como una forma modificada del vocablo chaouch, que en árabe significa arreador de animales.
La denominación se aplicó generalmente al elemento criollo (hijos de españoles) o mestizo (hijos de españoles con indígenas), aunque sin sentido racial sino étnico ya que también fueron gauchos los hijos de los inmigrantes europeos, los negros y los mulatos que aceptaron su clase de vida.
El ambiente del gaucho fue la llanura que se extiende desde la Patagonia hasta los confines orientales de Argentina, llegando hasta el Estado de Rio Grande del Sur, en Brasil (gaúcho).
El proceso evolutivo del gaucho y el uso de esa palabra se desarrolló sin solución de continuidad. Distintos tipos de gaucho existieron en Argentina antes de 1810, es decir antes de ser conocidos con ese nombre. Peones de campo existieron desde que comenzaron a formarse las primeras estancias, aunque hayan sido pocas al principio. El tercer tipo - que luego se llamó gaucho alzado - existió en reducido número. Pero no fueron los primitivos peones ni los "fuera de la ley" quienes le dieron la característica suficientemente fuerte para llamar la atención.
Es indudable que el tipo de gaucho que tuvo realmente fisonomía peculiar - el primero que fue llamado así - fue el gaucho nómada, no delincuente, que estuvo implícito en el gauderío oriental del s. XVIII. Este gaucho fue algo más que un simple vagabundo. Adquirió en la Argentina, a lo largo del s. XIX rasgos propios bien definidos. Y cuando se difundió suficientemente - es decir, a medida que fue creciendo la población rural - fue llamado gaucho, como también se había llamado al paisano oriental del s. XVIII.
Hábiles jinetes y criadores de ganado, se caracterizaron por su destreza física, su altivez, su carácter reservado y melancólico.
Casi todas las faenas eran realizadas a caballo, animal que constituyó su mejor compañero y toda su riqueza. El lanzamiento del lazo, la doma y el rodeo de hacienda, las travesías, eran realizados por estos jinetes, que hacían del caballo su mejor instrumento; en el caballo criollo no sólo cumplía las faenas cotidianas sino que con él participó en las luchas por la independencia, inmortalizando su nombre con las centauras legiones de Güemes.
Fue el hombre de nuestro campo, principal escenario de su vida legendaria y real. De vida solitaria ya en grupos de tiendas, como las tribus nómades ya en racheríos aislados como en la pampa sureña.

martes, 10 de marzo de 2009

El gaucho y su origen




Por volta de 1580, os cavalos abandonados na região do Prata em 1536 tinham se multiplicado aos milhares. Por volta de 1600 não podem ser mais contados em suas gigantescas manadas. Os Pampas do Rio Grande, Uruguai e Argentina estavam povoados de cavalos chimarrões (cimarrones/selvagens) e o povo que vivia nessa região unida pela semelhança ambiental se tornaria um povo cavaleiro.

A posterior introdução do gado, que por sua vez torna-se também abundante e chimarrão e também formando rebanhos que chegaram a atingir (somando Rio Grande, Uruguai e Argentina) 40.000.000 de cabeças, sedimenta esta cultura. Agora haverá gado solto e sem dono em abundância para ser caçado com o laço por aqueles que não querem outra vida com liberdade tão incomparável. O gado chimarrão é a base da alimentação e origem de produtos que serão comercializados e/ou contrabandeados (na época uma rebeldia contra os pesados impostos).

Mas na origem da formação do gaúcho deve ser lembrado, os índios pampeanos (nossos charruas e minuanos) que logo se adaptaram magnificamente ao cavalo (por volta de 1607). A miscigenação do europeu com o índio, fundindo a cultura ibérica com a americana. A escolha do abandono da civilização pelos mozos perdidos (homens que optaram pela vida no pampa sem fim) sendo o primeiro registro em 1617, já com chiripá, poncho e bota de garrão de potro (tendo esta indumentária uma evolução gradual e natural até por volta de 1865 (com a substituição do chiripá pela bombacha), tendo se estabilizado relativamente até agora.

Índios, mozos perdidos, vagabundos do campo (1642), changadores (1700) e gaudérios são seus antecessores e de origem e comportamento bem semelhantes. Em que momento começa a existência gaúcho? É impossível passar a faca sobre este variado mosaico e separar as partes que em muitos momentos se sobrepõe.

A palavra “gaúcho” entretanto só aparece em crônicas de viajantes na América do Sul por volta de 1770 ou um pouco antes. Demonstra uma nova adaptação ou melhor, culminação dos tipos anteriores. Normalmente quando um padrão está determinado é porque sua existência é bem anterior. O gaúcho aparece simultaneamente (isto é importante frisar) no Rio Grande do Sul, Uruguai e Argentina.



O viajante francês Dreys (em observações entre 1817 e1825 aqui no Rio Grande) assegura: “Todos os exercícios de manejo e picaria dos mestres de equitação da Europa são familiares ao gaúcho, e alguns dos exercícios mais difíceis são mesmo entre eles divertimentos de crianças.”







Os hábitos dos antigos gaúchos, sejam alimentares, roupagem, aperos e arreios dos cavalos, forma de doma dos cavalos, forma de laçar ou bolear, maneira figurada de falar, palavras utilizadas e música, etc. passam a ser assimilados pelas novas ondas de colonização que sofreu o continente de São Pedro do Rio Grande do Sul com os açorianos em 1752. A cultura de fora se rende a cultura local e adapta-se, transforma-se ou desaparece.

Neste período, muitos gaúchos são Vaqueanos (que conhecem a região como um mapa impresso em sua cabeça nos seus mais mínimos detalhes) e guiam viajantes e exércitos pelo pampa. Outros tocam infindáveis tropas de gado por léguas sem fim, outros carreteiros transportam produtos cortando a região de todas as maneiras. Os antigos e primeiros gaúchos nômades (antes injustamente chamados de ladrões no período do gado cimarrão, dizemos injustamente pois se concordarmos com o epíteto, estaremos assumindo o lado do mais forte, pois na realidade havia um enfrentamento de forças pela posse de um produto sem dono: o gado) agora trabalham em fazendas sazonalmente (são talhados para este trabalho pois são exímios laçadores, boleadores, carneadores e artesões de produtos de couro necessários a montaria, são pouco exigentes e parecem se divertir no trabalho mais duro) e influenciam de forma espantosa os filhos dos colonos na campanha ou povoados por que passam. Os gaúchos influenciam o comportamento de toda região. Sessenta anos após a chegada dos açorianos, Saint-Hilaire anota em seu diário que seus descendentes não querem outro modo de vida para, as vezes, contrariedade dos pais. Todos querem ser como os gaúchos. Nota-se traços deste fato mesmo na rígida colônia alemã já em 1858, anotado por Avé-Lallemant (para Avé-Lallemant, esses alemães demonstram nos campo, traços de gaucharia, que se destaca no manejo do laço, condução da tropa e pelo modo de montar e destaca alemães aparecerem montados a cavalo, com elegantes ponchos listrados).

Quando o inglês Luccock esteve no Rio grande em 1808 (quase 200 anos atrás!), a região está no interior completamente acriollada (ou agauchada). Todos andam a cavalo na região, sejam índios, soldados, escravos, peões, estancieiros, comerciantes, viajantes ou crianças.

Logo todos serão unicamente povo: o gaúcho.



Um documento impressionante é o escrito pelo belga A . Baguet em 1845 em Viagem ao Rio Grande do Sul. Fala de crianças com poucos anos cavalgando sem sela a toda velocidade, na forma como montam colocando o pé descalço no joelho do cavalo; a provação dos ventos da pradaria; a lealdade nas guerras; o costume da hospitalidade mesmo entre os mais pobres; a confiança humana nos vaqueanos; os costumes principais como o do mate (e suas propriedades) e churrasco os quais descreve em detalhes; a exibição dos arreios com prata mesmo dos vaqueanos mais simples (como o seu próprio guia); o impacto da imagem do pampa; a habilidade do gaúcho nas boleadeiras e principalmente no cavalo. Menciona à exaustão com preciosas descrições a habilidade do gaúcho com o cavalo, o qual considera o melhor cavaleiro do mundo junto aos índios.

Vejamos algumas observações de Dreys (1817-1825) sobre os rio-grandenses: “Independente dessas armas comuns aos militares, o rio-grandense traz consigo duas armas auxiliares peculiares, que somente os homens desta parte da América sabem manejar com habilidade: queremos falar do laço e das boleadeiras.”

“Tem o rio-grandense contraído uma espécie de aliança com o cavalo, em virtude da qual é feito auxiliar indispensável da vida do homem, o cooperador assíduo de quase todos os seus movimentos. O rio-grandense folga em percorrer suas imensas planícies a cavalo.(...) A predileção que manifesta por seu cavalo não se contenta a admiti-lo como companheiro inseparável; ele se ocupa também em adorná-lo(...).”

“(...) as guerrilhas do Rio Grande empregadas contra o estrangeiro nessas guerras, adquiriram uma reputação de firmeza e de coragem que o inimigo não desconheceu. A coragem do rio-grandense é fria e perseverante(...).”





Fazendo um parêntesis, é bom lembrar que estes gaúchos (considerando além do Rio Grande, os gaúchos do Uruguai e Argentina) são a base utilizada na guerra em seus respectivos países, os quais lhes devem seja a independência, seja a manutenção das fronteiras (sem os gaúchos, basicamente rio-grandenses, Rosas, na Argentina, não teria caído por exemplo). No Brasil o caso é exemplar. Quem manteve as fronteiras ou lutou nas guerras foram deste estado. Pena que isto não seja lembrado nos livros de história.

Sobre a honra diria ainda Dreys: “Sua palavra (dos rio-grandenses) é inviolável”.





Vários comentaram sobre a hospitalidade do rio-grandense/gaúcho, entre os quais Arsène Isabelle (1833): “A hospitalidade é ainda, entre a maioria, uma virtude que se pratica com generosidade.”





No seu comportamento o gaúcho antigo e o acriollado trazem um respeito para quem os trata com respeito, tem uma base ética, mesmo que rudimentar; são impetuosos; são peleadores quando necessário; tem certa atração pela guerra desde que seja a cavalo (jamais à pé); atração pela montaria que se manifesta em enfeites muitos até de prata; tradição na indumentária e principalmente na forma de arreiar os cavalos.

A maneira de falar do gaúcho antigo chegou de forma impressionante até nossos dias. Mesmo nos maiores centros urbanos do estado, dezenas de palavras oriundas da lida campeira continuam sendo usadas com significado paralelo ao original (apesar de que a quase totalidade das pessoas que as utilizam desconheçam esta origem).

Chegaram até nossos dias também, a música, os payadores, a poesia gaúcha (culta sim, mas derivada do canto homens do campo do passado). Simões Lopes Neto no seu Cancioneiro Guasca, antologia da música popular gaúcha do passado nos mostra a atenção que os habitantes do interior tinham pelo gaúcho. Hoje ainda, muitas pessoas do interior, ligadas diretamente ou mesmo indiretamente ao campo, compõe música e fazem poesia, ou trovas a maneira ou lembrando a vida do gaúcho. Centenas de músicos de qualidade compõe letras e músicas campeiras (nem sempre com apoio da mídia local). Festas que lembram as habilidades do gaúcho (doma e laço principalmente) são atração sempre que acontecem, mesmo nas zonas mais metropolitanas. Pesquisadores como Paixão Côrtes e Barbosa Lessa conseguiram recuperar muito da dança gaúcha.

Chegou-nos também uma espécie de reminiscência da campanha e um sentimento de épico. Veneramos a planície.

A base do comportamento do gaúcho (seu ethos) de forma geral chegou até nós e nos influenciou, isto é um fato. Pelo menos até 20 ou 30 anos atrás. Entretanto, a massificação proporcionada pela televisão e globalização (além de um antigo preconceito local a influencia gaúcha) ameaçam esta antiga homogeneidade de povo. O “ser gaúcho”, ou seja, a manutenção de características mínimas que nos identifiquem, tais como gosto pela música nativa, pela literatura regional ou manutenção do comportamental básico (combatividade era uma das características) passa a ser visto por intelectuais (rio-grandenses, pasmem!) como “negativa” e atrasada. Estes intelectuais (com marcada visão etnocêntrica) não consideram que expressam seu modo urbano (ou globalizado?) de ver. Contraditoriamente, estes mesmos intelectuais, entretanto concordam que deve ser respeitada as culturas regionais de outros locais.

No mundo inteiro, incluindo sobremaneira Europa e Estados Unidos, festas regionais reforçam suas certezas sobre suas origens, como comportar-se frente a adversidade e planejar o futuro. Saberem quem são. Este é o sentido de conhecer-se o passado. Afinal “É tão grave esquecer-se no passado como esquecer o passado. Nos dois casos desaparece a possibilidade de história.”







Bibliografia básica consultada

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